terça-feira, 23 de abril de 2013

Ciências Complicativas

Uma das atividades que procuro desenvolver com os alunos nas sessões de apoio pedagógico é aquilo a que chamo "dissecar os livros". Os manuais escolares são coisas caras, que os pais compram muitas vezes com esforço e que, para além de muitas figuras coloridas, se supõe que contenham informação. Coisas importantes, que os alunos têm de saber para se tornarem adultos informados. A maior parte dos assuntos que vêm nos livros são fascinantes. Mas a maneira como estão explicados transforma-  -os numa tortura.
Dou um pequeno exemplo que vi hoje num livro de Ciências do 8º ano. Sabem o que é uma inundação? Toda a gente sabe, não é? Mesmo os alunos de 8º ano já sabiam, antes de lhes dizerem que as inundações são um dos "fatores de origem natural perturbadores do equilíbrio dos ecossistemas".
Mas importa não esquecer que quando há inundações, "as águas transbordam os seus leitos e espalham-se pelas populações circunvizinhas". Peço desculpa porque não tenho aqui o livro e provavelmente não me expressei do modo mais científico, mas o que me ficou na memória foi a palavra "circunvizinha". A sério? Não havia lá nada um pouco mais simples?
Aqui está uma palavra que eu nunca tinha usado na vida. E até agora estava convencida de que sabia o que era uma inundação. Tal como estava aquela aluna, antes de alguém lhe pôr o livro à frente.
Em vez de se concentrarem nos conceitos, em compreendê-los e em tentarem explicá-los por palavras próprias, os alunos passam horas a tentar decorar estas frases absurdas (acreditem, isto é apenas um pequeno exemplo).
A propósito disto, lembrei-me de uma TEDTalk em que um professor de Ciências se queixa exatamente do mesmo. Tyler DeWitt afirma o que muita gente já diz: que a aprendizagem precisa de um fator emocional, de uma relação com o conteúdo. Que para haver essa ligação emocional, é necessário que os alunos compreendam o que lhes estão a dizer. E que, se possível for (se ninguém se ofender com isso), é necessário que os conteúdos sejam apresentados de uma forma interessante e divertida. Por exemplo, contando uma história, da qual eles se possam lembrar melhor do que da palavra "circunvizinha".
DeWitt queixa-se de uma obsessão pela exatidão, de uma busca pela seriedade e perfeição cujo único resultado tem sido transformar o discurso científico em algo incompreensível. Ou seja: para evitar que os alunos aprendam factos que não são 100% corretos, estamos a fazer com que não aprendam praticamente nada. O que é que preferimos?

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